Qualquer pessoa que não tenha filhos e que já tenha observado de perto pais modernos, liberais e preocupados pode se deparar com uma experiência aterrorizante.
O cuidado e a atenção dispensados em detalhes da vida cotidiana da criança é assustador. Decidir o que ela comerá no jantar pode levar horas de uma cuidadosa negociação.
Todas as questões feitas pela criança são respondidas com uma atenção infinita – quanto tempo se demora para atravessar a Terra, de um extremo ao outro? De onde vem o vento? O que tem dentro de um átomo?
Os historiadores nos explicam que, em boa parte da história da humanidade, tais questões mal seriam consideradas. Havia uma grande chance de seu pequeno inquisidor estar morto antes da vida adulta, você poderia ter cinco ou seis criaturas do mesmo tamanho para colocar na cama todas as noites e, por isso, parecia lógico não investir muita energia nem emoção em fornecer respostas.
A infância era vista como uma fase fantasiosa essencialmente desconectada de qualquer determinante na vida adulta.
Esconde-esconde
Mas agora vivemos em uma sociedade e uma era em que predomina a máxima de que o sucesso ou o fracasso de um adulto está diretamente ligado à qualidade do tratamento que ele recebeu durante a infância.
Por trás das atividades familiares, das brincadeiras de esconde-esconde e dos passeios ao zoológico, as personalidades estão sendo construídas e é a partir disso que toda a força e criatividade dependerão para florescer. Lições emocionais que não são aprendidas de verdade na primeira infância nunca serão absorvidas – não sem caras e demoradas sessões de terapia.
Carência
Caso contrário, vamos ser carentes de aprovação dos outros e nunca seremos capazes de fazer escolhas ousadas, por causa da nossa incapacidade de tolerar um momento em que ninguém está nos aplaudindo. Vamos ficar ansiosos por não termos sido amados de verdade há 30 ou 40 anos.
Isso pode parecer uma explicação absurda para o nosso desenvolvimento, mas sua base não é totalmente infundada. Porque afinal somos criaturas que desmaiam ou morrem por causa de um coágulo no sangue de meio milímetro de diâmetro.
A filosofia moderna sobre a infância torna tudo significativo. O Joãozinho não está apenas sendo irritante quando ele empilha as almofadas no chão e diz ser um marinheiro de um navio naufragado que pede ajuda para se salvar dos tubarões.
Ele está explorando ideias contrastantes de desamparo e resiliência, que anos depois vão o ajudar a superar uma rejeição amorosa ou a aproveitar oportunidades profissionais.
Pode parecer fraqueza ou excesso de paparico. Pode parecer decadente.
Para quem está de fora, especialmente se for de outra geração, pode ser nauseante observar todo esse zelo, essa paciência para perguntas, a urgência de se cuidar de cada machucadinho, o jeito de tratar crianças como se suas opiniões realmente importassem.
Lógica
Mas apesar de tudo isso parecer fraqueza, há uma lógica pragmática em curso.
Assim como pais de todas as épocas e lugares, os pais de hoje querem a sobrevivência de seus filhos. A diferença é que eles agora operam com ideias bem diferentes sobre o significado de sobrevivência.
Não há falta de inteligência genuína. O que se precisa adicionar acima disso é uma mente que possa fazer conexão entre ideias, que consiga persuadir outros a comprar sua opinião, que seja capaz de lidar com grandes aspirações e plasticidade psicológica para lidar com a rejeição – e esse é o porquê de tanta paciência ser dispensada a desenhos de borboletas feitos por crianças, de tanta atenção com o menu do jantar, de tanto respeito com as opiniões dos pequenos.
Mundo problemático
Essas preocupações podem parecer maneiras de tentar conter um pânico imensurável em relação à audácia de se ter colocado uma criança nesse mundo problemático.
Contando que as crianças estejam na cama às 19h15, aprendam a amarrar o cadarço e sempre digam “obrigado”, a esperança oculta é a de que nós possamos miraculosamente evitar ter de provar um gole da xícara do arrependimento humano.
A natureza desproporcional das preocupações de pais modernos surgem no início de cada dia letivo, quando 20 ou 30 adultos se reúnem em uma sala de aula para dar adeus a suas preciosas proles.
Para quem está de fora é evidente que a vida por si só não vai fazer jus às esperanças depositadas nos ombros dessas crianças – não vai evitar divórcios, câncer de próstata, vícios, depressões mesmo se eles ganharem estrelas douradas.
As crianças podem até dominar a álgebra, desenhar amebas, escrever belas histórias sobre as férias e memorizar as capitais do mundo, de Wellington a La Paz. Ainda assim, nada pode ser feito para protegê-las dessa série de problemas.
Nem mesmo estudar mandarim nos fins de semana, praticar violino ou jogar xadrez vai resolver. Tanta coisa pode dar certo e ainda assim acabar sendo desfeita por falhas inevitáveis de nosso próprio temperamento e do ambiente que nos rodeia, um pensamento perturbador que tanto o sistema educacional quanto os pais tentam evitar.
Isso, no entanto, não é argumento para desistir. Parece que não conseguimos, de forma espontânea, nos sentir suficientemente importantes para nós mesmos, suficientemente dignos de conduzir nossa figura absurda pelos labirintos da vida, a não ser que em algum momento nós tenhamos sido privilegiados o suficiente para desenvolver um sentimento de que outra pessoa se importava de forma ilimitada e desmedida conosco.
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Postado por:ByPrila Fonte: BBC Brasil
O cuidado e a atenção dispensados em detalhes da vida cotidiana da criança é assustador. Decidir o que ela comerá no jantar pode levar horas de uma cuidadosa negociação.
Todas as questões feitas pela criança são respondidas com uma atenção infinita – quanto tempo se demora para atravessar a Terra, de um extremo ao outro? De onde vem o vento? O que tem dentro de um átomo?
Os historiadores nos explicam que, em boa parte da história da humanidade, tais questões mal seriam consideradas. Havia uma grande chance de seu pequeno inquisidor estar morto antes da vida adulta, você poderia ter cinco ou seis criaturas do mesmo tamanho para colocar na cama todas as noites e, por isso, parecia lógico não investir muita energia nem emoção em fornecer respostas.
A infância era vista como uma fase fantasiosa essencialmente desconectada de qualquer determinante na vida adulta.
Esconde-esconde
Mas agora vivemos em uma sociedade e uma era em que predomina a máxima de que o sucesso ou o fracasso de um adulto está diretamente ligado à qualidade do tratamento que ele recebeu durante a infância.
Por trás das atividades familiares, das brincadeiras de esconde-esconde e dos passeios ao zoológico, as personalidades estão sendo construídas e é a partir disso que toda a força e criatividade dependerão para florescer. Lições emocionais que não são aprendidas de verdade na primeira infância nunca serão absorvidas – não sem caras e demoradas sessões de terapia.
Carência
Caso contrário, vamos ser carentes de aprovação dos outros e nunca seremos capazes de fazer escolhas ousadas, por causa da nossa incapacidade de tolerar um momento em que ninguém está nos aplaudindo. Vamos ficar ansiosos por não termos sido amados de verdade há 30 ou 40 anos.
Isso pode parecer uma explicação absurda para o nosso desenvolvimento, mas sua base não é totalmente infundada. Porque afinal somos criaturas que desmaiam ou morrem por causa de um coágulo no sangue de meio milímetro de diâmetro.
A filosofia moderna sobre a infância torna tudo significativo. O Joãozinho não está apenas sendo irritante quando ele empilha as almofadas no chão e diz ser um marinheiro de um navio naufragado que pede ajuda para se salvar dos tubarões.
Ele está explorando ideias contrastantes de desamparo e resiliência, que anos depois vão o ajudar a superar uma rejeição amorosa ou a aproveitar oportunidades profissionais.
Pode parecer fraqueza ou excesso de paparico. Pode parecer decadente.
Para quem está de fora, especialmente se for de outra geração, pode ser nauseante observar todo esse zelo, essa paciência para perguntas, a urgência de se cuidar de cada machucadinho, o jeito de tratar crianças como se suas opiniões realmente importassem.
Lógica
Mas apesar de tudo isso parecer fraqueza, há uma lógica pragmática em curso.
Assim como pais de todas as épocas e lugares, os pais de hoje querem a sobrevivência de seus filhos. A diferença é que eles agora operam com ideias bem diferentes sobre o significado de sobrevivência.
Não há falta de inteligência genuína. O que se precisa adicionar acima disso é uma mente que possa fazer conexão entre ideias, que consiga persuadir outros a comprar sua opinião, que seja capaz de lidar com grandes aspirações e plasticidade psicológica para lidar com a rejeição – e esse é o porquê de tanta paciência ser dispensada a desenhos de borboletas feitos por crianças, de tanta atenção com o menu do jantar, de tanto respeito com as opiniões dos pequenos.
Mundo problemático
Essas preocupações podem parecer maneiras de tentar conter um pânico imensurável em relação à audácia de se ter colocado uma criança nesse mundo problemático.
Contando que as crianças estejam na cama às 19h15, aprendam a amarrar o cadarço e sempre digam “obrigado”, a esperança oculta é a de que nós possamos miraculosamente evitar ter de provar um gole da xícara do arrependimento humano.
A natureza desproporcional das preocupações de pais modernos surgem no início de cada dia letivo, quando 20 ou 30 adultos se reúnem em uma sala de aula para dar adeus a suas preciosas proles.
Para quem está de fora é evidente que a vida por si só não vai fazer jus às esperanças depositadas nos ombros dessas crianças – não vai evitar divórcios, câncer de próstata, vícios, depressões mesmo se eles ganharem estrelas douradas.
As crianças podem até dominar a álgebra, desenhar amebas, escrever belas histórias sobre as férias e memorizar as capitais do mundo, de Wellington a La Paz. Ainda assim, nada pode ser feito para protegê-las dessa série de problemas.
Nem mesmo estudar mandarim nos fins de semana, praticar violino ou jogar xadrez vai resolver. Tanta coisa pode dar certo e ainda assim acabar sendo desfeita por falhas inevitáveis de nosso próprio temperamento e do ambiente que nos rodeia, um pensamento perturbador que tanto o sistema educacional quanto os pais tentam evitar.
Isso, no entanto, não é argumento para desistir. Parece que não conseguimos, de forma espontânea, nos sentir suficientemente importantes para nós mesmos, suficientemente dignos de conduzir nossa figura absurda pelos labirintos da vida, a não ser que em algum momento nós tenhamos sido privilegiados o suficiente para desenvolver um sentimento de que outra pessoa se importava de forma ilimitada e desmedida conosco.
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Postado por:ByPrila Fonte: BBC Brasil
Prizuca!!! Eu tenho uma amiga que sempre diz que fica impressionada com minha paciência em explicar, negociar, e também ser sincera com meus filhos. Nunca precisei dar um tapa para mostrar a eles que determinada coisa não deve ser feita, assim como sempre contei a verdade na hora de levá-los para vacinar, o que iria acontecer e porque era preciso... Eles sempre entenderam, mesmo pequenos, e sempre foi muito tranquilo, mesmo com um chorinho de dor. E mais, nunca dei uma fugidinha para fazer algo, sempre avisei ou aviso que vou sair e se vou demorar ou não, mesmo eles ficando um pouco chateados,... Prefiro a verdade, do que deixá-los na dúvida de onde foi a mamãe, sem ter avisado. Acho que a franqueza, assim como a capacidade de colocar as verdades, em cada fase da criança é muito importante. Sempre li e concordo que lúdico faz parte desse universo infantil, mas muitas mães, em prol da preparação para o mundo, preferem ser mais diretas, tirando totalmente a fantasia que é importante. Digo isso, porque sempre ouço pessoas comentarem sobre da importância de preparar as crianças desde cedo para mundo,....Mas esquecem que a fase em que ainda são bebes de nada adianta colocar de um jeito tao direto, parece haver confusão nisso,,.... na forma como colocam as coisas,... Ai, sei lá, ja nem sei o que estou escrevendo aqui,... vou dormir,..hehehehe
ResponderExcluirNa verdade, me deu vontade de escrever e falar o quanto é importante preparar as crianças para o mundo, mas de forma adequada para cada idade. E amor, respeito e carinho não são formas de mimar, e sim, de preparar para a vida! E sim, de ensinar a ser pessoas melhores, mesmo com tantas adversidades e dificuldades na vida. Bjao querida,...acho que pirei por aqui,..hahaha
Pri, gostei muito desse texto, mas muito mesmo. É seu? Porque eu queria pedir licença para postar no nosso blog (dando as devidas referências).
ResponderExcluirAguardo resposta.
Abraços sempre afetuosos.